segunda-feira, 6 de julho de 2020

Os bancos e o capitalismo


(Texto de referencia: Ladislau Dowbor, no livro “O Pão Nosso de Cada Dia”, 2015)


Os bancos são intermediários financeiros necessários que trabalham com dinheiro dos outros, nosso dinheiro; São facilitadores nas transações do mundo real, nas atividades comerciais, e realizam atividades meio, apenas conectando as atividades fins  (produtiva), então, quanto mais eficientes forem, e custarem menos, melhor.

Ocorre que estes se tornaram, nos dias atuais, intermediários obrigatórios e são poucos, no que se transformaram em atravessadores, com poder de travar e ou facilitar mediante altos lucros.

Devido as novas tecnologias, o dinheiro, que é a matéria-prima bancária, hoje é imaterial, e passou a ser representado apenas como um sinal magnético na conta ou no cartão de crédito. Do outro lado, praticamente quem trabalha, hoje é obrigado a utilizar os serviços de intermediação financeira para guardar, aplicar, receber os salários, receber um valor de uma venda, ou apenas para fazer pagamentos. Esse mecanismo gerou muito poder.

Quando em 2008 os governos deram trilhões de dólares de dinheiro público a esses grupos privados, que tinham realizado especulações irresponsáveis, em detrimento de políticas sociais, salários e outros direitos, isso espantou até os mais informados.

Além desse fato, existem outros mecanismos de apropriação do dinheiro público por esses grupos privados. A alavancagem, é um desses mecanismos, que se permite ganhar dinheiro em cima de dinheiro que não se tem. 

Essas instituições nos sugerem que se há uma poupança sendo remunerada a 3,25% ao ano e empresta esses valores a 36%, ele ganha sobre a diferença. Agora, na realidade, ele empresta muito mais, muito além das poupanças depositadas, o que é mais arriscado, mas, nas vias normais as pessoas raramente retiram efetivamente o dinheiro do banco, na prática ele empresta 9 vezes dos valores depositados (se cumprir o Acordo de Basileia II), sem pagar nenhuma remuneração.

Para o leitor ter ideia o Lehman Brothers, um dos maiores do mundo, emprestou 31 vezes mais dinheiro do que tinha em caixa para emprestar, a custo zero, lucros fenomenais. Ganha-se muito com a alavancagem, com dinheiro que não se tem. Tudo legalizado (!).

Outro mecanismo é o Carry Trade, onde grupos financeiros mundiais, pegam dinheiro emprestados a 1% ao ano no Japão e o aplicam em títulos da dívida pública brasileira, que rendem 10%. Ganhando com as diferenças de juros sem sair da frente do computador em Genebra, e assim realizam lucros gigantescos, e o que gera uma volatilidade mundial de fluxos financeiros, sem nenhuma atividade econômica real por trás, e chamam isso de ‘mercados’. (Você deve estar a pensar, mas a Selic está em 2,25% aa? Ocorre que existem trilhões de reais já emitidos, circulando, a taxas muito maiores, com vencimentos para 2025, 2035, 2045...)

Existem ainda outros mecanismos como o High Frequency Trading, que são sistemas pré-programados que realizam compras e vendas de papeis em grandes escalas, em segundos; ou a Arbitragem, que trabalham com pequenas diferenças de preços (de moedas (U$) em diferentes bolsas).

Essa financeirização do sistema econômico mundial tornou a intermediação muito mais lucrativa que a atividade produtiva, o que formou uma classe social de rentistas, bilionários que lucram com o trabalho dos outros. Como os lucros sobre as aplicações financeiras são muito maiores que o ritmo da evolução do PIB, isso gera uma desigualdade crescente (entre ricos rentistas e a classe trabalhadora).

No Brasil existem ainda mais mecanismos: o cartel dos bancos, o sistema Selic e a evasão fiscal. No cartel, mesmo informal, não existe aqui poder regulador (CADE, BACEN?) que contenha as taxas elevadíssimas praticadas. No sistema Selic os bancos passaram décadas rentabilizando as captações via poupança em valores menores e embolsaram a diferença. E o terceiro mecanismo mais importante é a evasão fiscal, através dos paraísos fiscais, e estimasse que do Brasil existem cerca de US500 bilhões aplicados lá, com zero de tributação, aplicados por grandes players (HSBC, Goldman & Sachs, e semelhantes), sendo administrados em Miami ou Londres (principais praças financeiras do mundo, segundo o The Economist).

Longe do seu papel de fomentador das atividades econômicas, o sistema tornou-se uma especulação internacional que trava as atividades econômicas e qualquer restrição a essa máquina lucrativa gera reações duras, na mídia econômica e da grande mídia comercial brasileira.

Graças ao ex-presidente americano Ronald Reagan e a primeira ministra britânica Margareth Thatcher, o último sistema de regulação financeira mundial, criado em 1929, foi totalmente desmantelado.

No Brasil existem duas instituições que parcialmente cumprem ainda as funções de intermediação financeira à produção, e que escaparam das privatizações da era FHC, e mantiveram o financiamento ao setor produtivo do agronegócio e o imobiliário (o BB e a CEF).

A regra que interessa a sociedade é simples, o dinheiro deve ficar próximo de quem pode fazer algo útil com ele, e a administração privada desses recursos públicos (poupança popular) faz com que esses grupos possam fazer o que querem com o dinheiro dos outros.
O Estado, como principal agente público é indispensável não só como regulador, mas como fornecedor de serviços financeiros que permitam introduzir concorrência e racionalidade nesse sistema.

Então, da próxima vez que for numa agência, não desconte sua indignação no vigilante ou no funcionário, lembre-se que é o Governo Federal quem regula no Brasil, e que é esse mesmo governo que está prometendo, em todas as entrevistas (via Paulo Guedes), vender suas duas únicas instituições que poderiam fazer mais.

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